Hospital
As urgências dos hospitais agravam-me os sintomas, enfraquecem-me a voz, fragilizam-me. Chego doente e, enquanto espero, adoeço mais. O meu rosto ganha uma ruga de dor, não muito vincada, apenas o suficiente para não me confundirem com um familiar à espera de más notícias. "Acidente ou doença súbita?" E eu fico sempre sem resposta. Nunca sou assertivo. Balbucio: "doença súbita". Um fiozinho de voz. Não convenço ninguém. Há nomes estilhaçados nos altifalantes. Chamam-me. Engano-me na porta. O segurança está com cara de quem não percebeu o que me levou a entrar pela única porta aberta. "Já que aqui está, entre por aqui, mas a porta é aquela". Entrei no sítio certo pela porta errada. Nem tudo está perdido. Sou entrevistado por uma senhora de bata azul. Tira-me a temperatura. Dá-me uma pulseira amarela, o que me leva a aceitar a minha condição clínica sem sentimentos de culpa. Por outro lado, pode ser mais grave do que eu pensava. Encontro um amigo no corredor. Está à espera há quatro horas. Tem uma pulseira verde no pulso da mão direita. Não lhe correu bem a entrevista. Ele explica-me a triagem de Manchester. Não é má ideia e o nome dá-lhe credibilidade. Eu jamais confiaria numa triagem inventada em Moscavide.