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Circo da Lama

"Se ele for para a Suiça, não lhe guardo as vacas", David Queiroz, pai de António, vencedor da Casa dos Segredos

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Circo da Lama

01
Jul14

7700: a humidade, como tudo, é relativa

Bruno Vieira Amaral

Hoje, que já somos todos um pouco mais argelinos, convém reflectir sobre o que se passou em Porto Alegre, no estádio Beira-Rio, às 17 horas locais, com humidade relativa de 70% e temperatura de 30 graus centígrados, o que, tenho ouvido dizer, não contribui para a vontade de andar em correrias, futebolísticas ou outras. E o que é que se passou ontem? Já ouviram falar daquele livro em que Malcolm Gladwell defende que os fracos derrotam os fortes com mais frequência do que julgamos? Por acaso, tenho um exemplar aqui mesmo à minha frente. O livro intitula-se David e Golias – A Arte de Combater os Mais Fortes. O subtítulo está incompleto, claro. Falta o E Perder Quase Sempre. Foi isso que aconteceu ontem, no Estádio Beira-Rio, cidade de Porto Alegre, fundada em 1769 por Manuel Sepúlveda: o mais forte ganhou. Estávamos todos a torcer pela Argélia, não estávamos? Estávamos. E de alguma maneira que não conseguimos explicar através da ciência, as oportunidades da Argélia pareceram-nos mais oportunas do que as dezenas de oportunidades da Alemanha, que só tiveram uma utilidade benéfica, a de permitir ao guarda-redes argelino extraordinárias defesas, não foi? Foi. A partir da segunda parte percebemos todos como é que aquilo ia acabar, não foi? Sim. E, mesmo assim, quando a Argélia marcou aquele golo já no finalzinho pensámos que o que estragou tudo foi o golo do Ozil, não foi? Foi. Embora muito provavelmente se a Alemanha estivesse apenas a ganhar 1-0, aquele golo argelino e que Luís Freitas Lobo, que dedico a todos aqueles que verdadeiramente amam este desporto, atribuiu a Slimani (aliás, sempre que a bola passava para o meio-campo alemão, antes de ser recolhida por Mertesacker ou varrida por Neuer, os comentadores só viam Slimani), não teria existido, não é? É. A primeira parte foi equilibrada. Concedo. Até aos 35 minutos. A partir daí, a Argélia estoirou. Os jogadores chegaram de gatas ao fim da primeira parte e o grande mérito de Halilhodžić, o homem mais bonito em campo, foi o de ter conseguido que uma equipa comandada por Halliche tivesse a mais de cabeça o que tinha a menos de pulmões, devido à humidade de 83%, num jogo disputado na bela cidade de Porto Alegre, estado do Rio Grande do Sul, Argentina, com mais de um milhão de habitantes e um número de cabeças de gado que, se colocadas em fila, dariam duas voltas ao mundo. A segunda parte foi um exercício de apneia futebolística, em que a selecção argelina vinha à superfície durante alguns segundos para logo de seguida regressar às profundezas do seu meio-campo. Quando ficavam à beira do colapso, aparecia M’Bolhi, um rochedo de gelo no deserto argelino (dedico esta a Luís Freitas Lobo e a todos aqueles que amam verdadeiramente a humidade), ou a inesperada misericórdia teutónica. Como diria José Maria Pedroto, jogaram ao ataque, fechadinhos lá atrás. Do outro lado, Golias dava-nos poucos motivos para simpatizarmos com o seu gigantismo e o melhor futebol que, naturalmente, apresentava. Viram o que aconteceu quando os jogadores alemães tentaram marcar um livre apalhaçado que incluía uma queda busterkeatoniana de Müeller? Imaginem os insultos, as considerações sociais e culturais a que seriam sujeitos os autores de uma brincadeira daquelas se, por um acaso, fossem oriundos de um país latino ou africano. O gozo sobranceiro da eficácia da Europa do Norte, o riso escarninho perante o número estéril, a criatividade falhada. Quando querem ter piada, os alemães não têm piada nenhuma e ficam sempre com aquele ar de turistas bêbados à beira de apanhar clamídia. Li no facebook que Neuer jogou a líbero, o que se deve, em partes iguais, a uma linha defensiva muito subida, à influência de Guardiola e à humidade que, à hora em que Neuer fez a terceira saída aos pés de Slimani, devia andar por volta dos 103%. Vá lá, 101%, valor a partir do qual os jogadores começam a respirar ao contrário. Para mim está claro que a influência de Guardiola tem sido funesta para o futebol alemão. Ainda não demoveu os alemães de chutarem à baliza de fora da área, mas vê-se que já lhes entortou a mira. A equipa de 2010 era uma maravilha de precisão em velocidade. A deste ano quer desenvolver uma espécie de tiki-taka em que a bola, na maior parte do tempo, é trocada entre Mertesacker e Boateng, esses Xavi e Iniesta da bacia do Ruhr. Já tenho poucas esperanças que a Alemanha volte aos níveis de há quatro anos. Quanto à Argélia, recordou os mais esquecidos da merda que foi a prestação portuguesa neste mundial.

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