O Post do Ano
Merecia ser publicado numa revista, embora eu duvide que as nossas revistas mereçam um texto destes.
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Merecia ser publicado numa revista, embora eu duvide que as nossas revistas mereçam um texto destes.
O Circo da Lama, na pessoa do seu único autor, tem todo o gosto em esclarecer o simpático leitor que fez esta simpática pergunta. Embora Raymond Liotta seja, de acordo com o IMDB, um especialista em "psychopathic characters who hide behind a cultivated charm" é também "by all accounts a nice, well-adjusted family-man off screen." Portanto, podem aproximar-se de Ray Liotta sem quaisquer receios desde que ele não esteja a representar.
Estou ligeiramente nauseado ou, nas palavras imortais da minha tia, “veio-me um arroto azedo à boca.” O livro 101 Monstros, de Simon Sebag Montefiore, está recheado de maldades suculentas, mas tudo tem os seus limites. Que Idi Amin gostasse de canibalizar os adversários (Montefiore não dá a receita) uma pessoa ainda compreende. Afinal, o homem intitulava-se “Senhor de Todos os Animais da Terra e dos Peixes do Mar e Conquistador do Império Britânico em África em Geral e no Uganda em Particular”. Não é a degustação do fígado de um inimigo que faz dele mais ou menos louco. Há muitos hábitos gastronómicos que nos parecem repelentes. Calígula, por exemplo, terá comido a irmã, embora não haja notícia que a tenha deglutido. Provavelmente confundiu-a com a mãe. Isto é perdoável. Até Vlad, príncipe da Valáquia, tem desculpa. Vlad na realidade era Vlad II e todos sabemos como as sequelas costumam ser piores que o original. Por tédio ou por maldade, Vlad divertia-se se a empalar camponeses. Também espetava pregos na cabeça de embaixadores estrangeiros, uma prática que infelizmente a diplomacia moderna prefere ignorar. Quanto à empalação podemos afirmar que a sua fama negra é exagerada. Passamos a explicar: crava-se uma estaca no chão e, em seguida, crava-se o camponês na estaca. Consoante o género, o camponês pode iniciar o percurso pelo ânus ou pela vagina. Quando a estaca chega à boca (ou a boca chega à estaca, visto que não é esta que investe mas sim o camponês insensato que desliza), aconselha-se a vítima a cumprir um período de repouso não inferior a 80 anos. Como é óbvio, um número considerável de camponeses chegava ao fim da empalação num estado que a ciência designa como “estar morto” e que os médicos que fazem urgências e são entrevistados pela RTP caracterizam como “chegar cadáver.” Mas também não foi isto que me deixou indisposto. O que me perturbou foi o descuido do tradutor. Então não é que traduziu The Feast of the Goat como O Festim do Bode? O título original do livro de Mario Vargas Llosa é La Fiesta del Chivo, mas a edição portuguesa existe e é A Festa do Chibo. Ora, isto é indesculpável. Uma verdadeira monstruosidade, a única capaz de me provocar um esgar de nojo ao longo desta leitura. Empalemos os tradutores!
Que eu me lembre, nunca matei uma cantora. Quanto a Miss Novak, ela já matou um trompetista eslovaco, um assador de castanhas sírio e um tipo que fazia uma péssima imitação do Frank Sinatra. Duvido que um curriculum destes não inclua pelo menos uma cantora. Certamente não tão famosa como esta Cynthia Larissa, uma vedeta no Chipre e que aparece nos jornais. As nossas missões costumam ser mais simples e os nossos alvos mais recatados. A ideia de eliminar alguém com esta visibilidade deixou-me nervoso durante todo o dia. Até adiei o meu plano de consultar uma prostituta local. Eu sou da opinião que só se conhece uma cidade quando se frequentam restaurantes e prostitutas, ambos baratos. As pessoas perdem horas numa fila para a Sagrada Família quando, em menos de vinte minutos, poderiam ter acesso à verdadeira e mal lavada Catalunha. Naturalmente, nem a Dolores nem nenhuma das suas amigas vende postais e apenas uma ou outra deixa que lhes tirem fotografias, ainda que para isso tenha de se pagar uns euros a mais. Os menos afortunados, trazem clamídia e chatos como souvenirs indesejáveis. Os mais cuidadosos, entre os quais me conto, beneficiam da experiência incomparável de ouvir como se finge um orgasmo em catalão.
Às nove horas e trinta minutos do dia 21 de Agosto de 1939, Adolph Hitler, um sujeito colérico e de bigode à Hitler, decide invadir a Patagónia. Goebbels (lê-se guêi bóls) aplaude histericamente. A sala ocupada por meia dúzia de generais bêbados e de palas no olho esquerdo aprova enquanto sussurra que aquele louco vai conduzir a Alemanha à desgraça. Hitler sabia que os inimigos não estariam preparados para uma guerra. Em duas semanas, os ingleses apenas conseguiriam encenar o Rei Lear com anões irlandeses. Nada que impedisse a vitória alemã. Os franceses só representariam um perigo se, em vez de combates e ataques aéreos, a guerra se decidisse numa prova de queijos. Hitler acreditava que o exército francês até a invadir uma retrosaria sofreria pesadas baixas. A eventualidade de uma guerra e a aniquilação dos judeus não eram os únicos assuntos a ocupar a mente do Führer. As futuras adaptações cinematográficas da sua vida também o preocupavam. Hitler desconfiava que, no futuro, alguém iria captar a complexidade psicológica e retratar a dimensão humana e estava mesmo a ver que Bruno Ganz iria desempenhar esse papel.
“Mas a Patagónia fica na América do Sul, mein Fuhrer”. Hitler, que não admitia um mein fuhrer sem o trema no u, sorriu e perguntou-lhe se achava que aquilo era hora para lições de geografia. Não era. A aula de geografia era às onze. “Invadir a Patagónia será uma demonstração do vigor da raça alemã. O povo alemão precisa de muito espaço vital e ninguém se preocupará com a Polónia”. Espanto. Polónia? Teria Hitler dito Polónia? A notícia chegou rapidamente ao gabinete do primeiro-ministro inglês, Chamberlain. “Hitler quer invadir a Patagónia…e a Polónia” Chamberlain pousou a raposa que até então estivera a acariciar. “Onde é que fica a Patagónia?” Os assessores entreolharam-se. “A Patagónia fica…extremamente longe”. “E o que é que há na Patagónia? Há judeus na Patagónia?” “Não. Quer dizer, há um rabino, um tal Abraão Abramovitz, mas os nossos serviços aguardam informações” “Hmm...este Hitler é perigoso. Conseguimos ter as nossas tropas preparadas em quanto tempo?” “Para vencer os alemães? Eu diria que em duas gerações teremos pronto um exército capaz de perder sem humilhações desnecessárias.” “E daqui a duas semanas?” “Em duas semanas podemos montar um belo espectáculo musical para receber os esquadrões da Luftwaffe em Londres, ainda que não seja fácil rapar as pernas a irlandeses bêbados” “Podemos contar com os franceses?” “Sim, mas de que nos vale fazer bons queijos em tempo de guerra?” Chamberlain ficou desgostoso. A guerra era uma chatice. Se ao menos pudessem resolver toda aquela trapalhada com uma partida de críquete.
Eu gostei dos The Gift. Era jovem, acreditava no Nuno Galopim e havia a Sónia Tavares. E aquilo era pessoal de Alcobaça e eu tenho uma grande simpatia pela região Oeste, uma área razoavelmente obscura, propícia a produtores de fruta e artistas com o glamour de funcionários públicos. Também não era difícil apreciar a capacidade de iniciativa do quarteto. Consta que manufacturavam os cds e se calhar havia um primo que lhes imprimia os bilhetes e o “merchandáize” numa reprografia dos Pousos. Esta peculiar combinação de amadorismo e talento musical (na verdade, era uma apropriação pueril de Portishead e Divine Comedy, como se uma Beth Gibbons fosse largada na A8 e tivesse o azar de ser atropelada por uma carrinha conduzida por um Neil Hannon) foi celebrada como um exemplo nacional do “do it yourself”, ou seja, Guerra das Estrelas filmado na Marinha Grande com vassouras em vez de sabres de luz. O entusiasmo provocou delírios. Falou-se em internacionalização – o mais duradouro mito urbano da música portuguesa e que teve o seu auge com aquele disco em que o Miguel Ângelo cantava em castelhano. Todos sabemos o que isso quer dizer: primeiras partes em Huelva e inúmeras referências no Ípsilon ao interesse demonstrado por editoras internacionais (“Imprensa inglesa rendida ao charme de …”; “franceses não resistem a …”; “agricultores do Connecticut só ouvem The Legendary Tiger Man”). Esgotado o filão internacional, a banda de Alcobaça regressou à base e às raízes. Amália. Objectivo: dar a conhecer Amália às novas gerações, o equivalente a popularizar o fado com a música do Pingo Doce. Dar a conhecer Amália desta forma, sem a voz de Amália, com a voz de Sónia Tavares em perfeita agonia entre sintetizadores operáticos que só me lembram a XX Grande Gala Travesti, é uma ideia bizarra. A presença crowleyiana de Fernando Ribeiro é sinistra e, ao mesmo tempo, enche-nos de esperança. Pode ser que ele tenha sido convidado para decapitar os outros. Já não gosto dos The Gift. E o Natal já não é o que era.
"Não te sentes com o rabo nu sobre a pedra." - Comentário de Estaline a um desenho de uma figura masculina sem roupa.
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