Férias
As férias, não o trabalho, são a coisa mais burguesa que existe, ainda mais do que as batatas pré-fritas e os sacos do aspirador. Suponho que sejam uma das conquistas de Abril, mesmo quando são gozadas em Fevereiro. O trabalhador, reza a legislação, tem o direito inalienável às férias, como um escravo mal comportado tem direito a um intervalo entre a 25ª e a 26ª chibatadas. Recebe o subsídio de férias que apenas serve para o manter afastado das imediações do local de trabalho. As férias começam com os habituais “finalmente”, “já não aguentava aquilo”, “estava pelos cabelos” e a ladainha prolonga-se durante a primeira semana. A segunda semana é pródiga em “como é bom estar longe daquela gente”, “e os outros a ter de aturar filas e transportes”. Com a terceira semana vem o tédio, outra invenção burguesa. O dinheiro escoou-se e resta-nos A Praça da Alegria e o Opinião Pública. Seguem-se as revelações e as boquiaberturas de espanto: o sorriso da Sónia Araújo depois de ter ficado sem um Jaguar, vítima, ao que parece, de um daqueles casos de combustão espontânea muito comuns na área metropolitana do Porto. No Opinião Pública discute-se a liderança do PSD, mas um telespectador aproveita para insultar a convidada, Inês Serra Lopes, referindo-se ao processo Casa Pia. Leio o Sol (poderá a isto chamar-se heliomância?). Concordo com a Ana Cristina e percebo o título do jornal: O Polvo. Aqueles dois são cefalópodes (e por mais do que um motivo). Muito mais grave do que não haver liberdade de imprensa, é a liberdade de impensa estar ameaçada por...aquilo. É óbvio que aqueles tipos têm de se mover em águas profundas, na sombra dos gabinetes. Se assomam à superfície, acabam em salada. A sério. Para que o tráfico de influências se possa credibilizar, é necessário arranjar umas caras decentes. Na preparatória, eu tinha colegas com caras daquelas e uma coisa posso garantir-vos, nunca lanchavam. Aproveito para deixar registado que nada disto melhora as minhas férias.