Diamantes
Thriller histórico é um rótulo que esconde mais do que revela sobre aquilo que é O Olho de Hertzog. Não é inexacto, é insuficiente, como são todos os rótulos quando aplicados a bons romances. Há a Lourenço Marques do pós-I Grande Guerra, reconstituída com riqueza de detalhes que captam a diversidade de uma urbe labiríntica, moderna e arcaica, entre o cimento e a palha. E há o mistério, O Olho de Hertzog, o diamante procurado por todos, e cujo segredo é gerido com mestria pelo autor, como se de uma preciosa pedra narrativa se tratasse. O que liberta o romance do espartilho do thriller histórico mais simplista está na afirmação de uma das personagens: “já nada do que ali se passava tinha a ver com o diamante”. A jóia é um engodo. O que interessa são as personagens, as suas motivações, os vários passados que carregam e que tentam dissimular com outros nomes, outras vidas. O tenente alemão Hans Mahrenholz aparece em Lourenço Marques como Henry Miller. Florence Greeff é Florence de la Rey. Natalie Korenico é Peggy Foster. O incansável jornalista João Albasini assina alguns editoriais como João das Regras (o branco) e outros como Chico das Pegas (o indígena). Hans perde-se neste labirinto de passados inventados e de identidades falsas, incapaz de resistir às histórias que lhe vão contando. Aquilo que a princípio parece um pobre recurso para dar a conhecer ao leitor os acontecimentos, revela-se o trunfo do romance: um novelo de histórias magnéticas que inebriam o protagonista e prendem o leitor. Onde o romance falha é na linguagem, excessivamente conformista, sem rasgo. Tivesse João Paulo Borges Coelho guardado para a prosa metade do que investiu na arquitectura narrativa, teríamos um grande romance. Assim, é apenas bom. Um diamante narrativo sem o brilho da prosa.